Há leis que protegem a vegetação e a permeabilidade da área que a prefeitura quer ceder para feiras e eventos. Ministério Público questionou a criação de despesas para gestão seguinte.
Reunião promovida pela Prefeitura em 17 de dezembro sobre a intenção de conceder à iniciativa privada o Parque Trianon, na Avenida Paulista, em frente o MASP, renovou preocupação de técnicos, do Ministério Público e da sociedade civil quanto à possibilidade de tal concessão contrariar legislações distintas e causar prejuízos não só aos cofres públicos, mas também ao delicado fragmento de mata atlântica que ainda se preserva naquele trecho da cidade de São Paulo, com espécies arbóreas de mais de 350 anos.
Na reunião, o engenheiro agrônomo Eduardo Pereira Lustosa, que é membro da área técnica do Ministério Público de São Paulo, afirmou que a concessão do Trianon “é temerária” porque o parque preserva mata atlântica de “valor inestimável” para a cidade. Disse que seria necessário o processo de concessão evitar qualquer ampliação do estacionamento abaixo da praça Alexandre de Gusmão (possível pelo projeto original de concessão) e qualquer tipo de corte ou de supressão de vegetação para implantar, ampliar ou reformar qualquer estrutura, pois a vegetação do parque é imune de cortes, de acordo com o decreto estadual número 30443, de 1989, artigos 2º e 10º, e outras leis nos níveis municipal e federal.
O engenheiro também vê a necessidade de que o processo vede, antes de qualquer coisa e já no contrato, qualquer perda de permeabilidade no Trianon ou nos outros parques lindeiros, que também entrariam na concessão. Cimentar, asfaltar ou calçar o solo no local seria “absolutamente inadmissível” porque o complexo do Trianon fica no início de uma encosta e sua permeabilidade é essencial para reduzir enchentes nos bairros que ficam logo abaixo.
Para Raphaella Galletti, que participou da reunião como representante de moradores da região, a concessão tem um erro de origem, que é a utilização dos mesmos critérios utilizados na primeira concessão de parque público feita pela Prefeitura de São Paulo, em 2019. “É um erro tentar repetir no Trianon o mesmo modelo de concessão praticado no Parque Ibirapuera. São áreas completamente distintas de qualquer ponto de vista ambiental, social e técnico”, disse ela. Francisco Bodião, do coletivo Fórum Verde Permanente, também chamou a atenção durante a reunião para a necessidade de se discutir o modelo de concessão adotado pela Prefeitura de São Paulo. Ele, Cláudia Santana Martins e Débora Iácono, ambas também do coletivo, afirmaram ser necessário ampliar o espaço de debate com a sociedade civil, já que os conselhos dos parques estão sendo alijados dos processos de concessão.
Assim que foi lançada a concorrência para concessão do Trianon, o Ministério Público questionou se isso seria possível tendo em vista o artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal (lei 101/2000), que proíbe a contratação de despesas para gestões futuras, assim como a lei de licitações, que poderia ter restrições à realização de licitação em data próxima a uma eleição.
A Prefeitura negou que fosse realizar despesas para outras gestões pagarem, porém um relatório do TCM emitido em 16 de outubro destacou diversas obrigações que estariam sendo assumidas pela Prefeitura nesta concessão e que poderiam ser prejudiciais ao erário, tais como a ampliação automática do prazo de concessão em caso de “reequilíbrio” (alteração contratual para não levar a prejuízo uma das partes) ou o fato de o contrato considerar a retirada da concessão por parte da Prefeitura automaticamente como um risco a ser ressarcido à empresa concessionária. O TCM considerou tais questões favoráveis à empresa
concessionária e, algumas, redundantes, pois já contavam com legislação federal que determinava seus parâmetros.
O Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM) havia elaborado, em outubro, um relatório que que não deixa pedra sobre pedra da minuta inicial de contrato e da licitação com as quais a Prefeitura pretendia conceder os parques municipais Prefeito Mário Covas e Tenente Siqueira Campos (Trianon) e, no mesmo pacote, incluir a vizinha Praça Alexandre de Gusmão.
O relatório apontou imprecisões, erros técnicos e inconsistências que poderiam causar prejuízos graves aos cofres municipais e ao patrimônio público, uma pressa injustificável em concluir o processo e prazos definidos sem fundamentação adequada. Muitos problemas contratuais que, se mantidos, invariavelmente beneficiariam as empresas que assumiriam os parques, em prejuízo do erário municipal e ao monitoramento da operação pela sociedade civil.
As “armadilhas” em que a própria Prefeitura se colocaria com esses documentos que iniciaram o processo de concessão são inúmeras, assim como as situações em que há conflito de interesses, com a atribuição à própria empresa concessionaria de demandas que caberiam ao poder público, tais como verificação de satisfação dos munícipes com a concessão, ou a responsabilidade por laudos que impactariam diretamente nos valores do contrato.
Por Fórum Verde Permanente de Parques, Praças e Áreas Verdes
Commentaires